quinta-feira, junho 30, 2005

sol

e talvez
num momento de revelação
apareça uma luz
ténuamente desabrochando
até se tornar
o mais puro dos dois

talvez essa luz não consuma
como tantas antes
(como todas antes)
e deixe so as cinzas de um passado
(de onde nem uma fénix pode renascer)
e aqueça
com doçura
este corpo cansado
deitado
e evapore as lágrimas
que teimosas
escorrem
para a terra

talvez este novo astro queime intensamente
e desvaneça
talvez fique ali
no céu
a brilhar
(mais forte que o sol)

talvez gostasse de ter certezas
e deixar de usar a palavra
talvez...

mas estou bem assim
quente

quarta-feira, junho 29, 2005

apesar de tudo

desejamos
caminhamos sobre os sepulcros
dos nossos anjos caidos
que se desfizeram com o impacto
e que
apesar de não termos encontrados todos os bocados
enterramos para não os recordarmos
e não os encontrarmos
até que algum sobreviva
e o encontremos
não desfeito
mas inteiro na sua omniosa figura
e finalmente um sorriso assome
em nossas faces a muito mortas

sábado, junho 18, 2005

folhas

são como folhas caidas
estas memórias esquecidas
destruidas e pisadas
pelas areias do tempo

lentamente caido
da ampulheta
inexorável
a passagem do tempo
tudo cura

folhas pretas
caidas
podres
que alimentam a terra
e servem de adubo

e crescem novas àrvores
viçosas
grandes
cujos ramos crescem e crescem e crescem
ate tapar o sol
e a raiz morrer

novas folhas surgem
no lugar que outras deixaram
e novamente o circulo da natureza
tem um novo início
e a ampuleta dá uma volta
e começa tudo de novo

da morte
à vida
à morte
para sempre

quinta-feira, junho 16, 2005

verdade

há muito que a incessante busca pela verdade deixou de fazer sentido, não existe nada que possamos defeninir como verdadeiro, nada que possamos tocar e sentir e dizer "isto é!".

Os sentidos enganam, a mente distorce, a realidade contorce-se num estertor moribundo e no entanto aqui estamos, num mundo de possivel irrealidade, e lutamos para o tornar cada vez mais irreal com cada fôlego que tomamos, tornamo-nos os arautos universais da nossa propria inexistência.

Agora apenas luto para tentar descobrir algo, irreal ou não, porque valha a pena viver ou, em casos extremos, algo pelo qual valha a pena morrer.

Ainda estou para descobrir esse algo.

Talvez o método de procura não seja o mais correcto mas espero aperfeiçoar com a passagem do tempo.

Eu sei que algures aí fora
está algo
que valha a pena morrer

uma morte, uma vida

hoje estou triste
morreu uma amiga
(a única que viveu realmente em mim)

agarrei-lhe a mão pálida
enquanto se esvaia em sangue
e tu!
vulto sombrio que seguras a faca
com a qual abriste o golpe
escondes-te
nas profundezas da minha mente

não há tempo para últimas palavras
não há tempo para uma ultima troca de olhares
para um último beijo como nas frígidas telas de cinema
num instante o fogo da sua vida apaga-se
deixando os olhos tristes e a pureza do vestido branco manchada

já não escorrem lagrimas da minha face
nem mesmo para lavar a minha mão manchada de sangue
fecho-lhe os olhos deixando uma fita de sangue marcada
como uma tatuagem de guerra
no rosto da paz

levanto-a nos meus braços
(meus cansados e pesados braços)
e levo-a
através do longe e da distância
para longe daqui
para longe de ti

cresce dentro de mim um grito
que tento calar
mas que grita por dentro
"perdoa-me"

e lá estás tu
sempre nas sombras
da minha doce loucura
puxando-me para baixo
atando-me em teus braços
sofregamente
lambes a faca
ainda manchada

minha doce loucura

minha noiva moribunda
jaz agora no gelo
onde apenas as amaranth crescem
(mas mesmo elas murcham)

volto-me e lá estás tu
sublime na tua beleza
una com as sombras
percebes melhor que ninguém
a dor
o prazer
a simples essência de ser
sem nunca ter ambições de o ser

abraço-te
e lavo teu seio com minha lágrima solitária
afagas-me a cabeça como tantas vezes fizeste
poisas a faca finalmente e consumimo-nos

como sempre fizemos
circularmente
gritamos finalmente de prazer orgiástico
e o ciclo recomeça
uma vez mais

escrevo
não por inspiração
não pelo doce susurro das musas mortas
mas por raiva
por um incomensuravel sentimento de solidão
se move minha trémula mão

luto enraivecido contra o sono
que teima em lutar
(estou a tentar tornar a sua vitória pírrica)
contra mim

regressei a este pouso de (des)conforto
a este confessionário aberto mais uma vez
triste

raivoso

e escrevo palavras que noutras situações
poderiam passar por palavras
de amor

tremo perante esta palavra que escrevi
e perante o aumento da irrealidade do seu significado a cada momento
que passa
aqui
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